O próximo presidente da República herdará um grave problema quando assumir em 2027: contas públicas desequilibradas e dívida em trajetória de crescimento.
Caso Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reeleja em 2026, caberá a ele próprio enfrentar o legado fiscal de seu primeiro mandato.
Desde que Lula assumiu, em 2023, o endividamento público, medido pela dívida bruta do governo geral (DBGG), saltou de 71,4% para 75,9% do PIB.
Nos primeiros 27 meses de mandato, o governo registrou déficit primário – diferença entre despesas, excluídos os juros da dívida pública, e a arrecadação – anualizado em 22 deles.
Analistas consultados pela Gazeta do Povo alertam para o agravamento das finanças públicas, com perspectivas mais desafiadoras a partir de 2027.
A situação tende a piorar devido ao crescimento das despesas obrigatórias e à ausência de reformas estruturais no ritmo adequado.
O mercado financeiro projeta que o endividamento público chegará a 94% do PIB em 2034, segundo levantamento realizado pelo Banco Central junto a instituições financeiras.
O endividamento cresce mesmo após o novo arcabouço fiscal de Lula, estabelecido em agosto de 2023, que é mais flexível que o teto de gastos implementado por Michel Temer.
Problema estrutural de gastos
O economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, explica que o arcabouço atual limita o crescimento das despesas, mas falha em alterar a estrutura rígida dos gastos públicos.
“Como resultado, quase nada tem sido feito para conter o avanço das despesas mandatórias, agravando o quadro fiscal”, diz.
O cerne do problema está na estrutura do Orçamento, onde mais de 90% dos gastos primários da União são obrigatórios, aponta Marcelo Karvelis Franco, CIO da Avin Asset. Essas despesas incluem Previdência Social, folha de pagamento e benefícios sociais como BPC e Bolsa Família.
O mais preocupante é que a maioria desses gastos cresce automaticamente, muitas vezes atrelada ao salário mínimo ou a fatores demográficos, sem que o governo tenha controle efetivo sobre seu aumento.
Reflexo da crise fiscal:
Estado inchado estrangula investimentos produtivos.
O crescimento contínuo das despesas obrigatórias acima da receita líquida comprime os gastos discricionários – aqueles onde o governo tem margem de manobra para investir e custear o funcionamento da máquina pública.
Como consequência direta, a capacidade de investimento público, crucial para o desenvolvimento de longo prazo, caiu drasticamente nas últimas décadas.
Analistas apontam que um Estado com gastos engessados e limitada capacidade de investimento estratégico falha em seu papel subsidiário de criar condições para o florescimento da livre iniciativa e do desenvolvimento individual integral.
Renúncias fiscais: privilégios que distorcem o mercado
Em paralelo aos gastos excessivos, o Brasil abre mão de aproximadamente R$ 600 bilhões anuais – de 4% a 5% do PIB – em receitas através de isenções, deduções e regimes especiais. Esses mecanismos são conhecidos, no jargão da contabilidade pública, como gastos tributários.
“Muitas dessas renúncias beneficiam setores específicos, geram distorções na economia e comprometem a arrecadação sem garantir um retorno social ou econômico claro”, explica Salto.
Uma revisão completa desses benefícios seria fundamental para ampliar a receita disponível, mas enfrenta resistências políticas.
2027: o momento da verdade para as contas públicas
Diante da rigidez dos gastos e da pressão da dívida, o próprio arcabouço fiscal pode se tornar inviável antes do fim da década, destacam Lívio Ribeiro e Matheus Ribeiro, da BRCG Consultoria.
O próximo governo, independentemente de quem seja eleito, enfrentará o imperativo de conduzir um programa estrutural de contenção de despesas diante da crise fiscal.
A partir de 2027, as regras fiscais precisarão ser revistas.
Uma opção seria promover uma revisão expressiva do gasto público para que o Estado “caiba” nas regras, como aponta Alexandre Pletes, head de renda variável da Faz Capital. Se isso não for feito, a alternativa seria flexibilizar as regras para acomodar um Estado maior, o que levaria à perda de credibilidade, juros altos e baixo crescimento.
A falta de sinalização clara sobre soluções fiscais pelo Congresso e grupos políticos deixa as expectativas econômicas “à deriva”, comprometendo investimentos, consumo e o ambiente de negócios.
O debate é ignorado pelo Executivo e Legislativo, mas o projeto de Lei das Diretrizes Orçamentárias (PLDO) para 2026 evidencia a urgência de ajustes fiscais, destacando que o problema reside no controle de gastos públicos, não na arrecadação.
Como definiu o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, trata-se de uma “crise fiscal contratada”, cujas consequências serão sentidas nos próximos anos.
A solução passa por um compromisso político em torno de uma agenda de mudança no gasto do governo, buscando um Estado mais eficiente e focado em suas funções essenciais.
“O ritmo atual de melhora gradual não é suficiente. Será preciso algo mais ousado para conter as despesas mandatórias e os gastos tributários”, conclui Salto.
fonte: Gazeta do Povo
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